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O covarde assassinato do menino Bernardo Uglione Boldrini provoca, neste primeiro momento, reações inevitáveis de revolta e comoção, ao mesmo tempo em que reacende a discussão sobre a necessidade de se fortalecer e qualificar a estratégia preventiva contra abusos e maus-tratos infantis. Mesmo sob esse estado de choque, e ao mesmo tempo em que ainda tentam entender as razões da brutalidade, a sociedade e as instituições com atua-ção nessa área precisam reavaliar suas estruturas de proteção à infância. E, ao mesmo tempo, refletir sobre o que pode ser feito para melhorar o atendimento a pessoas nessa fase da vida. Isso significa reavaliar não apenas toda a estrutura de amparo assegurada por lei, mas também questões de ordem cultural. Entre elas, está a de que a sociedade pode, sim, agir de forma mais consequente e mais objetiva quando depara com qualquer tipo de desrespeito a direitos assegurados a meninas e meninos.
A Constituição de 1988 e, dois anos depois, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) abriram caminho para avanços importantes na atenção a pessoas ainda em fase de desenvolvimento físico e psicológico. Desde então, os espaços de atendimento se multiplicaram nos Conselhos Tutelares, no Ministério Público, nas delegacias especializadas de Polícia, nas Varas da Infância e da Juventude e numa infinidade de organismos que, no setor público ou por iniciativa da sociedade civil, se empenham em evitar o pior. Assim como na luta contra a criminalidade, porém, essas instituições nem sempre dispõem da estrutura adequada para fazer o que devem com o máximo de eficiência. Em consequência, os danos envolvendo crianças, na maioria das vezes no próprio ambiente familiar, são em número muito superior ao que sugerem os casos mais rumorosos.
As falhas na assistência preventiva à infância ocorrem por razões estruturais, mas também por questões culturais, e em ambos os casos é preciso enfrentá-las logo. Redes de atendimento devem contar com estrutura adequada de funcionamento, o que implica planejamento e recursos orçamentários adequados. Ainda assim, só podem executar plenamente suas funções se cada brasileiro conseguir deixar de lado convicções ultrapassadas como a de que em questões envolvendo outras famílias ninguém se mete. Crianças e adolescentes têm hoje direitos claramente assegurados, a começar pelo de plena atenção dos pais ou responsáveis. Quando esses princípios não são observados, é, sim, dever de todos, de vizinhos a professores, denunciar os abusos.
No universo infantil, tudo será sempre complexo, a começar pela dificuldade que significa para os adultos ouvir uma criança e entender o que ela quer dizer. A própria lei é limitadora, ao privilegiar a reinserção no meio familiar, que nem sempre se constitui no mundo sonhado por meninas e meninos. Tragédias como a do garoto Bernardo, porém, mostram que é preciso uma ação ampla e imediata para reforçar de vez uma vasta rede de proteção coletiva a toda criança em situação de risco.
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