sexta-feira, 23 de agosto de 2013

ADOLESCENTES INCENDIÁRIOS PODEM PASSAR 45 DIAS NA FASE

ZERO HORA 23 de agosto de 2013 | N° 17531

EDUARDO TORRES

RECOLHIDOS À FASE. Fogo em escola leva a punição

Nove adolescentes suspeitos de incêndio em Eldorado do Sul foram apreendidos em operação inédita


Com tom disciplinador e inédito em casos de vandalismo contra escolas, a juíza da Infância e Juventude Luciane di Domenico Haas determinou as internações provisórias de nove adolescentes, em Eldorado do Sul. Os garotos foram apontados pela polícia como responsáveis pelo incêndio da Escola Municipal de Ensino Fundamental La Hire Guerra, no bairro Sans Souci, na madrugada de 12 de agosto.

Nas primeiras horas da manhã de ontem, agentes da Delegacia da Polícia Civil de Eldorado desencadearam a Operação Educare. Uma garota de 13 anos e sete adolescentes entre 13 e 17 anos foram apreendidos nas suas casas. Apenas um deles, de 17 anos, jamais estudou na instituição. Todos moram próximo à escola.

– A internação é a única forma de fazer com que os adolescentes repensem suas ações e reflitam sobre a necessária mudança de comportamento – escreveu a juíza Luciane, na ordem que determinou as apreensões.

Não houve resistência mas, durante os depoimentos de mais de 20 pessoas nos últimos dias, nenhum dos envolvidos mostrou arrependimento.

– Era necessária uma reação dura diante da gravidade dos fatos, porque eles se mostraram adolescentes frios – comenta o delegado Alencar Carraro.

A operação não seguiu os moldes tradicionais das ações policiais. Os agentes foram acompanhados por oficiais do juizado e por conselheiros tutelares.

Segundo o delegado, as famílias de dois envolvidos já deixaram o bairro, alegando terem sofrido ameaças:

– São adolescentes de classe média, filhos de trabalhadores. Todos na comunidade se conhecem. Precisávamos ter certos cuidados para proteger essas pessoas de uma reação popular.

Internados provisoriamente na Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase), os adolescentes poderão ficar na instituição até 45 dias. É o período máximo para que a Justiça encerre o procedimento pelos atos infracionais de incêndio doloso, formação de quadrilha e dano ao patrimônio. Nesta etapa, as condutas de cada um serão individualizadas. E as penas, que podem ir da prestação de serviço à internação, dependerão de uma análise.

Conforme a investigação, a ação se deu por puro vandalismo. Nenhum deles apontou um motivo aparente. Três pavilhões foram arrombados e incendiados. Cerca de 700 alunos ficaram uma semana sem aula. O prejuízo estimado chegou a R$ 1 milhão.

Na madrugada do ataque, dois adolescentes foram apreendidos no local e confessaram participação. Eles apontaram outros dois garotos, também ouvidos horas depois. Mas, de acordo com o delegado Alencar Carraro, nem todas as informações correspondiam ao que a polícia encontrou na escola.



Filho grita com o pai durante o depoimento

A conclusão da polícia é que o grupo se reuniu na noite do domingo, dia 11, para beber em local próximo da casa de um dos suspeitos. Embriagados, dois deles teriam dado a ideia de invadir a escola.

Mesmo negando que os filhos tenham participado, entre os pais houve uma unanimidade: a dificuldade de impor limites aos filhos.

Em um depoimento essa constatação se materializou. Um adolescente gritou com o pai diante dos policiais. Outro, ao receber a intimação em casa para prestar depoimento, mesmo depois da confirmação da mãe de que ele compareceria, deu de ombros: “Não sei se vou”.

– Não é um grupo com histórico de antecedentes policiais. Quem não é aluno da escola, já foi. E eles compartilham de um perfil periférico nesse ambiente. São repetentes, com alto índice de evasão e faltas, além de problemas disciplinares que envolvem até mesmo agressões – diz o delegado Alencar Carraro.

Dois meninos admitiram que, em duas ocasiões, tentaram furtar no bar da escola. O único que não era estudante da La Hire Guerra, de 17 anos, envolveu-se neste ano em um roubo a ônibus, com um disparo, que deixou uma pessoa ferida.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

NOVE MENORES SERÃO RESPONSABILIZADOS POR INCÊNDIO EM ESCOLA

CORREIO DO POVO 19/08/2013 14:14

Polícia responsabilizará nove menores por incêndio em Eldorado do Sul. Fogo destruiu parte da escola La Hire Guerra e prejuízo atingiu R$ 1 milhão



Fogo destruiu parte da escola em Eldorado do Sul
Crédito: Divulgação / CP


A Polícia Civil ouviu na manhã desta segunda-feira o último jovem suspeito de envolvimento com o incêndio de uma escola em Eldorado do Sul na semana passada. A polícia acredita que nove adolescentes, entre 13 e 16 anos, tiveram efetiva participação no ato de vandalismo que destruiu parte da escola La Hire Guerra.

O delegado Alencar Carraro vai encaminhar o procedimento judicial ao Ministério Público de Eldorado, enquadrando os nove por formação de quadrilha, incêndio qualificado e dano ao patrimônio qualificado. Entre as medidas solicitadas por Carraro, está a reparação ao dano destruído que, em uma avaliação preliminar da polícia, atinge R$ 1 milhão. “Foi apenas vandalismo”, acrescentou.

Carraro disse que, apesar das mais de 20 pessoas ouvidas durante esta semana de investigação, a principal suspeita é que os adolescentes tenham destruído a escola sem motivação específica. Conforme Carraro, oito jovens são alunos ou ex-alunos da escola. Entre os adolescentes, dois já têm histórico de tentativa de arrombamento à cantina da instituição de ensino.


Fonte: Gabriel Jacobsen / Rádio Guaíba

SOLTOS NA REDE


ZERO HORA 19 de agosto de 2013 | N° 17527

RÓGER RUFFATO | CAXIAS DO SUL

Descontrole dentro do Case de Caxias. Jovens em cumprimento de medidas acessam a internet no alojamento


Longe dos monitores e sem a ameaça de revistas rígidas, jovens do Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) seguem o exemplo que vem dos presídios gaúchos. Eles acessam a internet via celular e se exibem em fotos ou debocham do frágil controle da instituição nas redes sociais. Pior: têm a opção de contato direto e sigiloso com integrantes de bondes e comparsas em liberdade.

Assim, combinam vingança contra desafetos e projetam ações para a hora em que ganharem a liberdade. Um desses internos é um rapaz de 18 anos. Após passagens pelo Case por tráfico de drogas, entre 2009 e 2011, ele ganhou semiliberdade, mas voltou a ser recolhido ao local em julho deste ano, também por envolvimento na venda de entorpecentes. De dentro do Case, o interno mantém a página no Facebook atualizada com recados e fotos.

Os posts são curtidos e comentados por amigos, a quem o adolescente não demonstra arrependimento por se envolver com a criminalidade.

Assim como esse infrator, internos de outras unidades do Estado também se comunicam com o mundo externo via aparelho celular. Na última quarta-feira, um adolescente de 17 anos modificou a foto de capa do perfil no Facebook. Ele cumpria medida em Caxias do Sul por homicídio, mas foi transferido para outra unidade em janeiro deste ano, de onde mantém fazendo as atualizações na rede.

De acordo com o diretor do Case, Cláudio Gonçalves, a instituição tem a meta de padronizar as buscas por celulares:

– Antes, tínhamos dificuldades em fazer as revistas uniformemente por falta de servidores. Com a chegada dos novos socioeducadores, no último mês, poderemos rever esses procedimentos. Vamos intensificar as buscas, principalmente em dias de visitas, quando entra muita coisa.


Monitores com medo das ameaças


Acuados por ameaças recorrentes que chegaram a se concretizar em julho – quando um monitor foi ferido nas costas com arma artesanal por um interno – servidores do Case denunciam o total descontrole sobre o que entra ou sai da instituição. Em 26 de julho, interromperam as atividades em protesto.

Segundo relatos de servidores ao Pioneiro, internos percebem a fragilidade do sistema e tentam fugas.

– Temos encontrado grande quantidade de drogas e celulares com eles. Esse material vem parar dentro do Case por visitas ou é jogado pelos muros. Não temos condições de revistá-los todos os dias – relata um servidor.

Para o juiz da infância e juventude Leoberto Brancher, o acesso de celulares e drogas no Case reflete a pouca vontade dos socioeducadores em manter as revistas constantes.

– Eles (os monitores) não estão fazendo o trabalho direito. Mas essa é uma questão que deve ser resolvida internamente. Como juizado apenas não posso permitir que brigadianos substituam socioeducadores e uma casa para o cumprimento de medidas se transforme em presídio – sustenta Brancher.

Conforme o diretor do Case, Cláudio Gonçalves, a unidade apresentará um plano de ação ao Ministério Público em 30 dias.

Reprodução Facebook

NO FACEBOOK - Alguns comentários, transcritos na linguagem dos adolescentes

- Após postar foto na quinta
“Olha come q nós tamo fikam na fé ai vagabundagem sabe o jeito logo é nós de novo”.
- Ameaça a grupos rivais pelo controle do tráfico, após foto publicada antes de adolescente ser apreendido.
“Manda vim que nois destroi”.

- Na sequência
“hoje mira atira mais amanha vai se alvo so nao deche pra para so quando tive cheio de buraco”

- Sem arrependimento
“Crime finalcia o seu sonho e depois cobra um alto preço mais não da nada é a nossa profisão”

- Desabafo
“Meu pior veneno cunpri a p... da pena mais sei q logo vo sai”

MENORES INFRATORES SÃO ESPANCADOS NA FUNDAÇÃO CASA EM SP


G1 GLOBO TV, FANTÁSTICO 19/08/2013 00h21

Imagens mostram funcionários da Fundação Casa espancando menores
Em uma unidade da Fundação Casa, a antiga Febem, na capital paulista, dois funcionários espancam seis adolescentes com muita violência.




O Fantástico mostrou imagens inéditas e chocantes. Em uma unidade da Fundação Casa, a antiga Febem, na capital paulista, dois funcionários espancam seis adolescentes, com muita violência.

Socos e tapas. Depois, uma sequência de chutes e também cotoveladas. Essa sessão de espancamento é recente. Aconteceu em maio, no Complexo Vila Maria da Fundação Casa, antiga Febem, na zona norte da capital paulista.

“Eu me surpreendi com essa imagem. Me impressionei. Uma imagem muito forte. Eu não tinha visto uma imagem como essa. São agressões físicas, que ofendem também a dignidade”, afirma Matheus Jacob Fialdini, promotor de Justiça da Infância e da Juventude.

As agressões, sofridas por seis adolescentes infratores, aparecem em filmagens, obtidas com exclusividade pelo Fantástico, que você vê no vídeo acima.

“É a primeira vez em 18 anos de atuação, visitando unidades da Fundação Casa, é a primeira vez que eu assisto essas cenas. E isso choca pela covardia com que os torturadores agiram nesses casos”, diz Ariel de Castro Alves, do grupo Tortura Nunca Mais e Movimento Nacional de Direitos Humanos.

Em uma semana, é a segunda vez que a Fundação Casa aparece com destaque no noticiário. A primeira foi segunda-feira (12). Dezenas de internos pularam o muro e chegaram a usar uma árvore para fugir da unidade Itaquera, na Zona Leste de São Paulo. Quarenta e nove jovens conseguiram escapar. Vinte e dois foram recapturados.

No mesmo dia, também houve rebelião na Vila Leopoldina, zona oeste. Somando esses distúrbios em duas unidades, 41 funcionários foram mantidos reféns e oito ficaram feridos.

“Muitas das vezes, o funcionário é vitima de um trauma dentro da unidade. Nós temos trabalhador com transtorno bipolar, trabalhadores com esquizofrenia, trabalhadores com síndrome do pânico”, destaca Júlio da Silva Alves, presidente Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Casa.

O que estaria acontecendo por trás destes muros? A violência - tão comum na época da Febem - estaria de volta, agora na Fundação Casa?

“Que tipo de tratamento, que tipo de medida que a gente está oferecendo para os nossos adolescentes?”, questiona Matheus Jacob Fialdini, promotor de Justiça da Infância e da Juventude.

O Complexo da Vila Maria, onde as agressões foram gravadas, abriga atualmente 521 adolescentes. Para a promotoria da Infância e da Juventude, o ideal seria ter bem menos, cerca de 320.

O complexo é dividido em 8 casas, como são chamados os centros de atendimento socioeducativo. Uma delas é a João do Pulo, onde foram feitas as filmagens das surras que os seis menores levaram. Na unidade João do Pulo, a capacidade é para 40 adolescentes, segundo o Ministério Público. Mas hoje, estão lá dentro 64 jovens infratores, entre 12 e 18 anos, que participaram principalmente de roubos e tráfico de drogas.

Em um vídeo, do dia 18 de maio, dois menores usam telefones celulares dentro da unidade, o que é proibido.

O promotor Matheus Jacob Fialdini faz visitas frequentes ao centro de atendimento João do Pulo e acompanha o processo de reabilitação. "É uma unidade de primários. Eles apresentam um comportamento melhor que em muitas unidades que concentram reincidentes. Uma unidade como essa, em tese, é considerada uma unidade relativamente mais fácil de administrar”, diz Fialdini.

Imagens foram gravadas logo depois de uma tentativa de fuga, no centro de atendimento João do Pulo. É noite de sexta-feira, 3 de maio passado. Na quadra, os jovens ficam sentados, só de cuecas. Wagner Pereira da Silva, o diretor da unidade, acompanha a situação. Ele é formado em direito e seguiu carreira em educação. Perto do diretor, um funcionário repreende os menores pelo motim.

“Exijo respeito e o cidadão vai ser respeitado. Não quero zona na minha casa. Eu estou dizendo a minha parte. Os senhores não estão fazendo a dos senhores”, diz o funcionário.

A direção da unidade deixou registrado, na lista de ocorrências que, nesse dia, nove adolescentes foram capturados antes que conseguissem pular o muro para rua. E que um grupo pôs fogo em alguns objetos.

“Fala a verdade. Você quebrou tudo. Você quer que dê beijo?”, pergunta o funcionário.

O funcionário, que ainda não foi identificado, faz ameaças de matar os menores e levar os corpos ao Instituto Médico Legal. Ele usa a expressão "dar boi", que significa "facilitar".

“Vou falar para os senhores: a mãe dos senhores vai visitar os senhores lá no IML. Lá no IML. Vai visitar no IML, porque eu não vou 'dar boi'. Muitos aí não têm nem a idade que eu tenho de fundação. Senhores, não vai sobrar nada dos senhores”, ameaça o funcionário.

“O que eu percebo hoje são funcionários completamente desqualificados, despreparados, que não recebem uma capacitação permanente”, avalia Fialdini.

A conversa com os jovens continua dentro de um quarto. Depois, em uma sala onde existe um quadro negro, começam as agressões. Primeiro, contra três adolescentes. Numa sequência: um deles leva um tapa e vai para o chão. Outro jovem recebe cotoveladas e socos.

Cerca de 20 segundos depois, as imagens mostram outros três menores apanhando.

“Um rosto de pavor, de medo, de agonia mesmo, com aquele espanto: ‘o que vai me acontecer?’ Com certeza, são ofensas que estão sendo proferidas. Olha o constrangimento: o adolescente acuado, bem no canto da sala”, destaca Matheus Fialdini.

No vídeo, aparecem dois agressores. Eles já foram identificados. São Mauríco Mesquita Hilário e José Juvêncio, coordenadores de área, responsáveis pela segurança no Complexo Vila Maria.

O espancamento durou cerca de cinco minutos. Nas imagens, 20 segundos depois, o diretor da unidade João do Pulo - Wagner Pereira da Silva - aparece do lado de fora da sala.

Ele fica em silêncio por alguns instantes. E vê quando os dois agressores - Maurício e José Juvêncio - falam com um adolescente que tinha acabado de apanhar.

“O que eu vejo: uma sensação de um diretor constrangido, incomodado. Mas até que ponto ele é conivente ou não com esse tipo de prática, só realmente a investigação vai poder apontar”, diz o promotor.

Quanto ao espancamento, o promotor da infância afirma: “É um crime de tortura, é gravíssimo. Isso dá cadeia. A pena é de reclusão. Pena mínima de dois anos de reclusão”.

Na sexta-feira (16), o promotor esteve na Unidade João do Pulo e conversou com vários menores. “O relato deles converge no sentido de que agressões estão sendo praticadas dentro dessa unidade. Eles narraram agressões muito similares a essas que na imagem a gente consegue ver”, afirma Matheus Jacob Fialdini.

O Fantástico mostrou as agressões sofridas pelos seis adolescentes para Berenice Gianella, presidente da Fundação Casa.

Ela relata como viu as imagens: "Repulsa total e absoluta. Isso é uma covardia. Isso é uma agressão gratuita, isso é um ato de tortura que é absolutamente abominável", avalia Gianella.

Berenice Giannella está no cargo desde que a Fundação Casa foi criada, em 2006, para substituir a Febem.

"Isto era o que se via antigamente na Febem. E apesar de serem os mesmos funcionários que já estavam aí antes, a gente fez todo um trabalho para que isso não acontecesse novamente", explica a presidente da Fundação.

Ela diz que uma tentativa de fuga, como a que aconteceu na Unidade João do Pulo, não justifica esse tipo de punição: “A fundação tem instrumentos para punir atos de indisciplina dos meninos. Ele pode até ficar cinco dias no dormitório, só saindo para escola e para as atividades educacionais. Então, não há necessidade e você vê que não é uma situação de confronto”, diz Berenice Gianella.

Na noite de sábado (17), os seis jovens agredidos foram identificados. Por questões de segurança, todas as informações deles - como nome, idade e motivo da internação - serão mantidas em sigilo.

“Nós vamos tirá-los dessa unidade e colocá-los em outro local que a gente possa resguardar a integridade física deles”, garante Berenice Gianella.

Assim que viu as imagens do espancamento, a presidente da Fundação Casa tomou a decisão de afastar dos cargos o diretor da unidade João do Pulo e os dois coordenadores de segurança, que aparecem nas imagens agredindo os adolescentes.

"Vamos também informar o caso à policia para instauração de inquérito policial porque isso se configura crime de tortura. Isso também precisa ser apurado na esfera criminal. Daria como punição demissão por justa causa imediatamente. É que eu não posso fazer isso. Se eu pudesse, eu o faria", ela afirma.

Como são servidores públicos, eles só podem ser demitidos depois de responder a um processo administrativo.

Também já foi afastado do cargo o coordenador de equipe Edson Francisco da Silva, que cuida da segurança na unidade João do Pulo. No vídeo, ele aparece assistindo às agressões e chega a empurrar um adolescente.

O Fantástico tentou falar com os funcionários da Fundação Casa citados nesta reportagem, incluindo o diretor Wagner Pereira da Silva. Mas a assessoria da instituição informou que eles não querem se manifestar.

“Esses funcionários serão, sim, não tenha dúvida disso, serão punidos em todas as esferas: administrativa, civil e criminal. Esses adolescentes serão protegidos”, garante Matheus Jacob Fialdini.

A Fundação Casa atende hoje a 9.236 menores infratores, em 148 unidades espalhadas pelo estado de São Paulo.

“Cada adolescente custa uma média de R$ 7,1 mil por mês. Eles têm psicólogos, assistentes sociais. São quatro refeições por dia. Tem escola, curso de educação profissional, esporte, cultura. E uma segurança que tem que funcionar 24 horas por dia”, destaca Berenice Giannella.

“É claro que nós temos que reconhecer que mudanças ocorreram. Várias grandes unidades foram desativadas e foram construídas pequenas unidades. Mas de qualquer forma, esse vídeo demonstra que nós temos ainda situações extremamente graves que precisam ser enfrentadas pela instituição”, afirma Ariel de Castro Alves, do grupo Tortura Nunca Mais e Movimento Nacional de Direitos Humanos.

Segundo o sindicato que representa os funcionários, 12,4 mil pessoas trabalham na fundação.

“É preciso que o estado invista mais na capacitação, na formação desses servidores e, por que não dizer, uma formação mais técnica. Um treinamento de gerenciamento de conflito, um treinamento de defesas pessoais. Isso é feito de uma forma bem superficial”, ressalta Júlio da Silva Alves, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Casa.

Nos últimos cinco anos, 65 funcionários foram demitidos por agredir adolescentes.

“A formação, a capacitação é dada. Mas, infelizmente, o desvio de caráter não é possível capacitar”, destaca Berenice Giannella.

“Nós temos que lembrar que esse jovem que é torturado vai sair da instituição. Eles podem se vingar de qualquer um de nós, na medida em que eles saem muito piores do que eles entraram”, completa Ariel de Castro Alves.



segunda-feira, 12 de agosto de 2013

REBELIÃO E REFÉNS EM UNIDADE INFRACIONAL

FOLHA.COM 12/08/2013 - 09h56

Menores mantém 12 funcionários como reféns em rebelião em SP

DE SÃO PAULO


Menores da Fundação Casa deflagraram na manhã desta segunda-feira (12) uma rebelião na unidade Vila Leopoldina, na zona oeste de São Paulo. O motim começou por volta das 9h20 após uma suposta tentativa de fuga.

Cerca de 12 funcionários da unidade são mantidos como reféns pelos jovens. Agentes da corregedoria da fundação bem como da superintendência de segurança da unidade estão no local e negociam com os internos.

A unidade da Vila Leopoldina tem capacidade para 150 internos e 100 adolescentes estão no prédio.

Os menores queimaram objetos dentro no pátio da unidade e escreveram frases como "Paz e justiça" no chão. Não há informações sobre feridos.

A Polícia Militar foi acionada e está em frente à Fundação Casa para tentar coibir qualquer possibilidade de fuga dos internos.

Esta rebelião acontece a menos de um mês um outro motim que aconteceu em uma unidade da Fundação Casa, na Grande São Paulo. No último dia 18 de julho, 17 funcionários da unidade Tapajós, em Franco da Rocha, foram mantidos reféns pelos internos. Três deles ficaram feridos.

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

UNIDADES INSALUBRES

ZERO HORA 09 de agosto de 2013 | N° 17517

EDUARDO ROSA

JOVENS INFRATORES
RS tem um terço de unidades insalubres. Relatório do MP não aponta superlotação em casas de internação no Estado


Pelo menos um terço das unidades de internação no Rio Grande do Sul são insalubres, atesta um relatório do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) divulgado ontem. Por outro lado, o índice de superlotação nas casas gaúchas que abrigam adolescentes e jovens infratores não é um problema constatado pelo documento – fica 1,5% acima do limite no que se refere a internação e 40% abaixo quando se fala em semiliberdade.

O estudo Um Olhar Mais Atento às Unidades de Internação e de Semiliberdade para Adolescentes reúne dados coletados por promotores de Justiça em inspeções entre março de 2012 e março de 2013. Foram visitadas 88,5% das unidades de internação e de semiliberdade para adolescentes e jovens em cumprimento de medidas socioeducativas no Brasil.

Em 12 unidades de internação no RS, com 734 vagas, foram contabilizados 745 adolescentes e jovens. Quanto à semiliberdade, 101 das 172 vagas estavam ocupadas. O promotor Júlio Alfredo de Almeida, da 8ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude, acredita que o dado sobre superlotação esconde a realidade de falta de vagas em Porto Alegre, uma vez que há sobra em parte do Interior. Almeida destaca, no entanto, que o grande problema está ligado à infraestrutura.

– É preciso construir mais unidades. Em Porto Alegre, estão bastante ruins – afirma, dando como exemplo o Centro de Atendimento Socioeducativo (Case) POA 1, na Vila Cruzeiro, que teve uma rebelião em maio.

De acordo com a Secretaria Estadual da Justiça e dos Direitos Humanos, R$ 6.459.786,32 foram investidos na área desde 2011, R$ 2.912.698,59 a mais do que entre 2003 e 2010. Entre as iniciativas para melhorar a situação, são citadas as reformas na Unidade de Internação Provisória Carlos Santos, na Capital, e no próprio Case POA I, que devem ser entregues no dia 19. No ano passado, o Ministério Público formalizou à Justiça um pedido de intervenção imediata e de solução definitiva para a superlotação de ambas. O governo estadual também salienta a contratação de 318 servidores (167 já estão trabalhando) e a construção de mais quatro casas da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Osório, Santa Cruz do Sul e duas na Região Metropolitana, incluindo a zona sul de Porto Alegre).

Conforme o relatório, o sistema oferece 15.414 vagas no Brasil, mas abriga 18.378 internos. Em alguns Estados, a superlotação supera os 300%. Dos 443 estabelecimentos no país, 392 foram visitados. A situação mais crítica foi verificada em Roraima, Piauí e Sergipe, onde todas as unidades de internação visitadas foram consideradas insalubres. São Paulo apresenta o melhor quadro: 91,3% foram apontadas como salubres.

– O quadro aqui revelado representa o Brasil de hoje. E é sobre os jovens de hoje que a sociedade deve estar debruçada – diz a conselheira do CNMP Taís Ferraz, presidente da Comissão de Infância e Juventude, na abertura do relatório.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - O QUE MUDOU EM UM ANO? QUE RESULTADOS PRODUZIRAM O PEDIDO DO MP AO JUDICIÁRIO EM 2012 NA MELHORIA DAS CONDIÇÕES EM 2013?


G1 17/05/2012 13h15

MP pede intervenção do Judiciário em casa de menores infratores no RS. Fase tem unidades de internação e semiliberdade na capital e no interior. Secretário diz que medidas serão tomadas para melhorar as condições.

Tatiana LopesDo G1 RS


Infiltrações causam problemas na estrutura dos dormitórios nas unidades (Foto: Divulgação/MP RS)

O Ministério Público do Rio Grande do Sul entrou com um pedido no Poder Judiciário solicitando intervenção na Fundação de Atendimento Socioeducativo do estado (Fase), com o objetivo de melhorar as condições da casa que abriga adolescentes autores de ato infracional em Porto Alegre. Tecnicamente, o MP pede apuração de irregularidades. Caso seja declarado pelo juiz que o local é irregular, um prazo para a correção dos problemas é estabelecido, com possibilidade de ser fechado parcialmente caso não sejam cumpridos pela Fase e pelo governo.

Imagem mostra a condição de um dos banheiros da Fase (Foto: Divulgação/MP RS)

Em contato com o G1 na manhã desta quinta-feira (17), o promotor Julio Almeida, da 8ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude, disse que o documento enviado para o Judiciário contém vídeos e fotos da casa que mostram, além de más condições, superlotação. "As condições são precárias, tem sujeira, mofo, as janelas não fecham. Tem até quatro adolescentes por quarto, os banheiros coletivos estão imundos, e há infiltração de umidade e urina", relatou.

Uma reunião nesta manhã entre representantes da fase e o promotor trata sobre o assunto. Julio Almeida explica que a medida é progressiva, já que não há como pedir uma intervenção total da Fase.

O documento fixa o prazo de três meses para a correção dos problemas de salubridade e higiene dos banheiros, reforma e reativação do refeitório; higienização, pintura e impermeabilização dos dormitórios (celas), no caso do Centro de Internação Provisória Carlos Santos; e salubridade e higiene dos banheiros, reforma integral e cessação das infiltrações; e higienização, pintura e impermeabilização dos dormitórios (celas) no Centro de Atendimento Socioeducativo (Case-Poa 1).

O governo do estado, através de informações repassadas por sua assessoria, diz que já tem valores destinados a investimentos nas unidades da Fase.


Posição do governo do estado

O secretário da Justiça e dos Direitos Humanos, Fabiano Pereira, afirmou ao G1que a questão da superlotação da Fase preocupa, e que medidas serão tomadas para melhorar as condições dos abrigos. Segundo ele, o ideal seria a construção de uma nova casa, e é neste sentido que o governo trabalha. "Já temos uma área, e parte do recurso, que é de R$ 5 milhões, que vieram do Ministério da Justiça. As casas custam em torno de R$ 12 milhões, mas já é um auxílio. Esperamos também o recurso de um financiamento internacional com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), de US$ 28 milhões de dólares", destacou.

Além disso, o secretário garantiu que recursos já começam a ser aplicados nas reformas das unidades. Somente para os banheiros, o governo deve investir cerca de R$ 700 mil. "Respeitamos a autonomia do Ministério Público, e estamos trabalhando para mudar a situação", salientou. Conforme Fabiano Pereira, algumas melhorias como pintura de paredes já estão sendo feitas.

A situação da Fase

A unidade Carlos Santos, com capacidade para 60 adolescentes, abriga hoje 127. A casa foi inaugurada em 1989 e serve como local de internação provisória. Dali, os menores infratores partem para outras unidades, estabelecidas após julgamento. Na unidade Case-Poa 1, inaugurada em 1998, existem atualmente 134 adolescentes, onde a capacidade é para 62.

No total, em todo o estado, a Fase abriga 963 adolescentes. Em regime de internação são 873, e de semiliberdade, 90.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

RÉPLICA DE PRISÕES


Unidades para menor infrator são réplicas de prisões, com superlotação e insalubridade, diz MP. Vistoria revela ainda falta de capacitação e de espaço para salas de aula

CAROLINA BRÍGIDO
O GLOBO
Atualizado:8/08/13 - 8h54





BRASÍLIA — Levantamento do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) revela que as instituições de internação de menores infratores são réplicas das prisões brasileiras, com altos índices de superlotação e insalubridade, somados à falta de salas de aula e de espaços para capacitação profissional adequados. Também são escassos os locais destinados a esporte, lazer e cultura. Cabem nas unidades do país 15.414 adolescentes, mas hoje os reclusos somam 18.378 — 2.964 a mais, configurando 19% de superlotação. O número excessivo de internos atinge 16 estados.

Grande parte das unidades sequer separa os jovens nas celas de acordo com a faixa etária, compleição física e infração cometida, aumentando chances de conflitos e rebeliões. Segundo o CNMP, pelo menos 13% dos casos de rebeliões estão diretamente associados à estrutura física das unidades.

“Não se pode esperar ressocialização de adolescentes amontoados em alojamentos superlotados, e ociosos durante o dia, sem oportunidade para o estudo, o trabalho e a prática de atividades esportivas. Não admira, então, que o espaço físico insuficiente e a falta de infraestrutura adequada tenham sido indicados como a causa que isoladamente mais propiciou a deflagração de rebeliões nas unidades de internação”, diz o documento.

No Maranhão, 335 jovens detidos onde cabem 73

Das 321 unidades de internação no país, 287 foram inspecionadas (89,4% do total). Também foram visitadas 105 unidades de semiliberdade das 122 existentes (86,1% do total). Considerando jovens em semiliberdade, o sistema mantém 20.081 adolescentes. As visitas ocorreram em março deste ano sob supervisão da conselheira do CNMP Taís Schilling Ferraz, que preside a Comissão da Infância e Juventude do órgão.

A superlotação é mais crítica no Nordeste: há mais de quatro mil internos para um sistema capaz de acolher pouco mais de dois mil. Maranhão e Alagoas são os casos mais graves, com índices de ocupação de 458,9% e 324,7%, respectivamente. As cinco unidades do Maranhão têm 73 vagas, mas abrigam 335 jovens. Nas cinco unidades de Alagoas, era para ter até 154 menores, mas hoje há 500.

“Os espaços que deveriam ser de ressocialização mais se assemelham a presídios e penitenciárias, com altos índices de superlotação, em alguns Estados, e pouquíssimas oportunidades de formação educacional e profissional”, conclui o estudo.

No Rio Grande do Norte, a situação é peculiar. Não há superlotação: das 110 vagas distribuídas em seis unidades, apenas 61 estão ocupadas. Entretanto, as instituições têm estrutura tão precária, que todas estão interditadas pelo Judiciário. Nas regiões Sul e Sudeste, a relação entre número de internos e vagas está equacionada. No Rio de Janeiro, há sete estabelecimentos com 860 vagas, das quais 859 estão ocupadas. No Norte do país, a situação é inversa: na maioria dos estados, há vagas.

Mais da metade das unidades de internação do Centro-Oeste, Nordeste e Norte foi considerada insalubre — sem higiene, conservação, iluminação ou ventilação adequadas. No Piauí, em Roraima e em Sergipe, todas as unidades visitadas foram classificadas de insalubres. No Rio de Janeiro, 71,4% das unidades foram reprovadas. A melhor situação está em São Paulo, com 91,3% de salubridade nas instituições, e no Ceará, com 89,9%.

Também não há separação dos adolescentes por idade, compleição física ou infração cometida, conforme determina o ECA. Apenas 16% das unidades do Centro-Oeste têm este cuidado com relação à idade. No Sudeste e no Sul, 20% dos estabelecimentos fazem a separação etária. No Norte, 32,5%. E no Nordeste, 44%.

As inspeções também encontraram 99 adolescentes internados nas unidades com transtornos mentais graves. O CNMP deu prazo para as unidades retirarem os jovens das instituições e encaminharem para tratamento médico.
CNJ recomenda a cinco governadores fechamento de unidades de internação de menores. Alguns dos 59 locais visitados tinham superlotação e condições insalubres

O GLOBO
Atualizado:24/07/13 - 19h30


Projeto Justiça ao Jovem em Teresina, no Piauí Luiz Silveira/Agência CNJ


RIO - O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) recomendou a cinco governadores que desativem unidades de internação de menores infratores em que o órgão constatou superlotação e condições insalubres. Segundo informação publicada nesta quarta-feira no site do Conselho, a recomendação vale para os governos do Distrito Federal, do Piauí, do Amapá, da Bahia e do Espírito Santo.

O CNJ visitou os sistemas socioeducativos estaduais de todo o país em 2012 pela segunda fase do Programa Justiça ao Jovem. Na época, foram encontradas péssimas condições em várias das 59 unidades inspecionadas.

Durante visita ao Macapá, por exemplo, verificou-se que a unidade dedicada à internação provisória de adolescentes do sexo masculino do Amapá (CIP) mantinha, em agosto de 2012, os mesmos problemas apontados no relatório da primeira fase do Justiça ao Jovem, elaborado em 2010: ambiente insalubre, estrutura prisional e ociosidade. Em funcionamento no mesmo prédio que o CIP, a unidade de internação feminina (Cifem) tinha um “ambiente insalubre, abundância de mosquitos e até retorno de água do esgoto, por entupimento em uma das celas”, aponta o relatório.

Com relação ao sistema socioeducativo baiano, as juízas auxiliares da Presidência Cristiana Cordeiro e Joelci Diniz pedem a desativação da Comunidade de Atendimento Socioeducativo (Case Salvador). As magistradas criticaram o aspecto prisional das instalações, onde um pequeno alojamento é usado para todas as internas.

A demolição da Unidade de Internação Feminina (UFI), em Cariacica, no Espírito Santo, foi pedida pelo CNJ em 2010 e reiterada ano passado. Segundo o relatório, a UFI foi a unidade com pior estrutura física entre as que foram visitadas no estado.

“A parte administrativa está situada, em parte, dentro de contêineres, os quais, anteriormente, eram utilizados como alojamentos”, relataram as magistradas.


CNJ: 43% dos jovens internados são reincidentes. Infrações que os levam de volta costumam ser ainda mais graves do que as anteriores

CHICO OTAVIO
O GLOBO
Atualizado:8/04/12 - 23h25

Em Vitória, na Unidade de Atendimento Inicial, encontraram até 84 jovens num lugar para 30 Pastoral do Menor/07-04-2012


RIO - Foram 16 meses de pesquisa, com visitas a 320 unidades e quase duas mil entrevistas, para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) chegar a uma conclusão: quatro em cada dez crianças e adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em estabelecimentos com restrição de liberdade são reincidentes. E as infrações que os levam de volta costumam ser ainda mais graves do que as anteriores. Os casos de homicídio, por exemplo, foram muito mais frequentes na segunda internação, aumentando de 3% para 10%, em âmbito nacional.

Este é um dos resultados da pesquisa “Panorama Nacional, a Execução das Medidas Socioeducativas de Internação”, na qual o CNJ levantou, de julho de 2010 a outubro de 2011, as condições de internação de 17.502 jovens em conflito com a lei. Entre os adolescentes entrevistados (pouco mais de 10% do total), 43,3% já haviam sido internados ao menos uma outra vez. O percentual é ainda maior quando levados em conta os 14.613 processos de execução de medida socioeducativa, também analisados pelos técnicos do Conselho: há registros de reincidência em 54% dos casos.

O levantamento, feito pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do CNJ, exibe um retrato completo desse jovem. Famílias desestruturadas, defasagem escolar e relação estreita com substâncias psicoativas estão entre os traços marcantes desse perfil. Embora o percentual de analfabetos seja pequeno (8% do total), 57% dos jovens entrevistados declararam que não frequentavam a escola antes de ingressar na unidade.

Uma vez internado, o jovem encontra pouco estímulo à reinserção social. O sistema está operando acima da capacidade. E a superlotação não é o único problema. O apoio psicopedagógico, considerado pelo CNJ imprescindível para o acompanhamento de déficits de aprendizagem, foi constatado em apenas 24% dos estabelecimentos. Para complicar a situação, há relatos de castigos e agressões: 28% dos entrevistados declararam ter sofrido algum tipo de agressão física por parte dos funcionários, 10% pela Polícia Militar, após o ingresso na unidade, e 19% afirmaram ter sido alvo de castigo físico durante a internação.

Abusos sexuais em 34 unidades

A pesquisa revela ainda que, nos últimos 12 meses, pelo menos um adolescente foi abusado sexualmente em 34 estabelecimentos. Há também registros de mortes de adolescentes que cumpriam medidas socioeducativas em 19 unidades. Além disso, sete estabelecimentos informaram a ocorrência de mortes por doenças preexistentes, e dois registraram suicídios.

O objetivo do CNJ, ao esquadrinhar as 320 unidades do país, foi elaborar diagnósticos e orientar políticas públicas para o setor. Pelo estudo, é possível saber também que a maioria dos adolescentes cometeu o primeiro ato infracional entre 15 e 17 anos (47,5%). Mas em 9% dos casos, o delito ocorreu ainda na infância, entre os sete e os 11 anos. Como a idade média do entrevistados era de 16,7 anos, os pesquisadores constataram que, considerando-se o período máximo de internação, boa parte dos jovens infratores alcançaria a maioridade civil e penal durante o cumprimento da medida.

Mas o que leva esses jovens à perda da liberdade? O levantamento do CNJ revela que roubo é o ato infracional mais cometido, representando 36% do total, seguido de tráfico de drogas (24%) e de homicídio (13%). O roubo obteve o mais alto percentual no Sudeste (40% dos delitos praticados). O crime de homicídio apresentou-se expressivo em todas as regiões do país, com exceção da Sudeste, onde esse delito corresponde a 7% do total. Nas regiões Sul, Centro-Oeste, Nordeste e Norte, o percentual varia de 20% a 28% (Norte). No Norte, os homicídios representam 28% do total de casos.

A respeito das relações familiares, os dados obtidos, mesmo que não surpreendam, são eloquentes. Dos entrevistados, 14% têm filhos. Sobre as relações em família, 43% declararam ter sido criados apenas pela mãe, 4% só pelo pai, 38% por pai e mãe e 17% pelos avós. Aproximadamente 75% faziam uso de drogas ilícitas, sendo esse percentual mais expressivo na Região Centro-Oeste (80,3%).

Na análise do número de evasões, um dado alentador: o Sudeste, com o menor percentual de evasão do país (3%), é justamente a região com maior oferta de atividades externas aos jovens internados.


‘Aquilo não educa, não muda, não faz ninguém crescer’. No Nordeste, superlotação contribui para descumprimento de medidas socioeducativas

ADRIANO MUNIZ
LETÍCIA LINS
BRUNO DALVI
O GLOBO
Atualizado:8/04/12 - 23h25


FORTALEZA, CABO DE SANTO AGOSTINHO (PE) E VITÓRIA - Ao analisar a taxa de ocupação das 320 unidades destinadas a jovens em conflito com a lei no país, a pequisa do CNJ constatou que não cabe mais ninguém no sistema, pois elas estão com uma lotação de 102%. A situação mais grave é a do Nordeste, com seis estados acima do limite: Ceará (221%), Pernambuco (178%), Bahia (160%), Sergipe (108%), Paraíba (104%) e Alagoas (103%).

No Ceará, cinco das nove unidades da capital estão superlotadas. O caso mais crítico é o do Centro Educacional Patativa do Assaré. São 145 interno para 60 vagas, segundo a Secretaria do Estadual do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS). Para o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente, a situação prejudica a recuperação dos adolescentes.

— As medidas socioeducativas acabam não sendo cumpridas porque o interno não tem o acompanhamento que deveria. Temos conhecimento que, em alguns centros, não há aula todos os dias. Outros têm, mas com a carga horária reduzida. Isso também é reflexo da superlotação — denuncia a assessora jurídica do órgão, Nadja Furtado.

Se em Fortaleza falta espaço, nas cinco unidades do interior há sobra: são 42 internos para 160 vagas. Vale ressaltar que 30% dos internos da capital vêm de outros municípios. Segundo a STDS, há uma “cultura” de enviar os infratores para Fortaleza, em vez de encaminhá-los para unidades do interior próximas à cidade onde aconteceu o delito.

Em Pernambuco, onde existem 1.430 internos ocupando 852 vagas, o quadro é grave. No Centro de Atendimento Socioeducativo do Cabo de Santo Agostinho, a 41 quilômetros da capital, por exemplo, três internos foram assassinados durante um motim, em janeiro último. O presidente da Fundação de Atendimento Socioeducativo, Alberto Nascimento, reconheceu, à época, o drama e disse que, após às 18h, imperava no local “a lei do cão”.

Relatório recente da Associação Metropolitana de Conselheiros e Ex-Conselheiros Tutelares de Pernambuco aponta problemas na Santo Agostinho, como atendimento médico e odontológico precários, comida de péssima qualidade e alojamentos úmidos. Na última quarta-feira, havia no local 340 internos comprimidos em 166 vagas

O documento relata ainda que, na Abreu e Lima, a 18 quilômetros de Recife, existem 311 internos em ambiente com capacidade para 98. Acusa uma “estrutura de espantar”, esgotos mal vedados de onde saem “baratas, ratos e escorpiões”, além de castigos e entrada de drogas com ajuda de agentes.

Alecsandra da Silva sabe o que é isso. Ao descobrir que o filho estava envolvido com o tráfico, resolveu denunciá-lo, acreditando que ele mudaria de vida. Nunca se arrependeu tanto:

— Lá na Abreu e Lima, ele apanhou muito e sofria ameaças dos agentes, que acobertavam o tráfico. Saiu pior do que entrou e foi assassinado após ganhar a liberdade. Aquilo não educa, não muda, não faz ninguém crescer — desabafa ela, que fundou uma associação para denunciar os abusos.

O governo de Pernambuco prometeu abrir 600 vagas, e Conselho de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente aprovou um plano de reordenamento do sistema socioeducativo.

No Espírito Santo, segundo o Instituto de Atendimento Socioeducativo, não há superlotação: são 655 internos para 882 vagas. Mas nas unidades de primeiro atendimento o quadro é desolador:

— O problema está na unidade onde os menores têm o primeiro atendimento — alerta o coordenador da Pastoral do Menor, padre Xavier Paoliello.

No último domingo, uma comissão de direitos humanos fez uma vistoria na Unidade de Atendimento Inicial (Unai), em Vitória, e encontrou as celas superlotadas, com menores algemados uns aos outros. Fotos mostravam 84 adolescentes num espaço que comporta, no máximo, 30.

Secretário de Estado da Justiça, Angelo Roncalli condenou o uso das algemas e abriu sindicância sobre o caso. Ele diz reconhecer os problemas, mas afirma que a superlotação é pontual e promete uma nova unidade até o fim deste ano.