Crianças desprotegidas, abandonadas, negligenciadas, sem amor, sem futuro, nos semáforos, vendidas, ao relento, violentadas e dependentes de drogas. Menores infratores depositados em lugares insalubres e inseguros, sem receber tratamento, oportunidades, educação, qualificação e reinclusão social. CADÊ OS PAIS? CADÊ A JUSTIÇA?
terça-feira, 24 de janeiro de 2012
OS MENINOS DO CRIME
EDITORIAL ZERO HORA 24/01/2012
O trabalho de reportagem que está sendo apresentado por Zero Hora sobre a trajetória de adolescentes internos na antiga Febem, no ano de 2002, é um atestado eloquente do fracasso de um modelo de recuperação de infratores que, infelizmente, ainda não foi totalmente extinto. Ao colocar nomes e biografias na estatística, o registro jornalístico evidencia dramas familiares e vidas desperdiçadas por uma nefasta conjugação de fatores que vão do ambiente degradado onde muitos desses jovens se criaram à incompetência do Estado para fazer o seu papel. Mas ainda são os números que chocam mais: de 162 jovens que cumpriam medida judicial no início do ano referido, apenas dois parecem ter se salvado da rotina de novas condenações, prisões e execuções. Os dados apontam para uma condenação coletiva. A Febem transformou-se em Fase em 2002, a metodologia de ressocialização de meninos e meninas infratores mudou bastante, mas ainda persistem alguns resquícios do autoritarismo e do descaso que transformaram tantos delinquentes juvenis em criminosos irrecuperáveis.
Se já é doloroso constatar que tantos egressos de um único ano tiveram destino tão trágico, mais assustador ainda é pensar que durante mais de 50 anos adolescentes autores de atos infracionais ou simplesmente abandonados receberam um atendimento que mais forma para o crime do que recupera. A partir da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, as instituições de atendimento de todo o país tiveram que se adequar às diretrizes da Doutrina de Proteção Integral – que inclui distinção entre o tratamento a ser dispensado a autores de infrações e às vítimas de violência e abandono. A Fase especializou-se no atendimento aos jovens penalizados com medida judicial de internação ou semiliberdade.
Mudou muito, mas não mudou tudo. A própria ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Maria do Rosário, admite que o sistema de caráter socioeducativo brasileiro ainda é apenas uma declaração de intenções, pois não consegue recuperar os infratores na dimensão desejada.
Não consola saber que era muito pior. A série de reportagens que está sendo apresentada por Zero Hora, com o objetivo de chamar a atenção das autoridades e da sociedade para o verdadeiro extermínio de vidas e futuros praticado durante tanto tempo com a conivência de todos, mostra um caminho sem volta. A reincidência no crime, o estigma da internação e a falta de oportunidades levaram a maioria absoluta do grupo investigado a condenações prolongadas, à clandestinidade ou mesmo à morte – destino de 48 deles, jovens que sequer tiveram a chance de se tornar adultos.
Mas este passado deprimente também pode ser utilizado como exemplo para o aperfeiçoa-mento do sistema e das instituições que hoje atendem crianças e adolescentes autores de atos infracionais. E deve servir, principalmente, para alertar os governantes e a sociedade sobre a urgência de investimentos em prevenção – a única porta capaz de impedir o acesso ao verdadeiro labirinto da ressocialização.
COMENTÁRIO DO BENGOCHEA - Na minha opinião, os jovens infratores deveriam ser internados em centros públicos de ressocialização distribuídos por todo o Estado capacitados para educar, tratar a saúde (dependência química, déficit e desvios psíquicos), descobrir talentos e ensinar uma profissão conveniada com o mercado de trabalho local. Aqueles que mostrarem periculosidade alta devem ser tratados em outro nível. Hoje, os jovens infratores são "depositados" em grandes grupos sem distinção em locais onde o monitoramento é falho, o tratamento da saúde é debilitada e as condições são precárias.
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