quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

MENINOS CONDENADOS/RECUPERADOS

Natanael e Rafael, dois exemplos de esperança. Natanael é vendedor e evangelizador. Rafael, marceneiro. ADRIANA IRION E JOSÉ LUÍS COSTA - ZERO HORA, 25/01/2012

Seus nomes emergem de uma lista de 162 adolescentes que estavam internados na Fundação Estadual do Bem-estar do Menor (Febem) em 1º de janeiro de 2002.

As histórias dos dois poderiam ser contadas em uma palavra: esperança. Dos 114 ex-internos vivos, os dois, uma década depois daquela internação, são exemplos do esforço para driblar e mudar destinos marcados pelo crime na adolescência.

São oriundos de um grupo em que a maioria teve a trajetória reduzida a mortes violentas ou à perda da liberdade, condenada por crimes.

De volta à comunidade onde construíra laços com o crime na adolescência, a vila Bom Jesus, em Porto Alegre, Rafael Patricio Machado, 27 anos, resistiu.

Os amigos do passado o procuravam.

– Aqui fora tinha muitos amigos. Lá (na Febem), ninguém te procura ou manda algo. Só minha mãe me apoiou – recorda o marceneiro.

A constatação ajudou Rafael , que aos 16 anos passou Natal e Ano-Novo longe da família, recolhido à fundação por assalto, a optar por uma reviravolta. Hoje, casado e pai de Rafaela, reflete sobre o que o levou a roubar.:

– Faltava dinheiro para sair, comprar roupa. Tu vais conhecendo pessoas, o dinheiro vem fácil. Agora, vivo do serviço para casa e para cuidar da família.

A região em que ele mora ganhou destaque nacional em 2009, quando o então presidente Lula a visitou para anunciar a instalação do primeiro Território da Paz do Estado. Na Bom Jesus, uma das vilas mais violentas da Capital, o projeto anunciado não se concretizou, mas é aposta do governo federal para a recuperação de jovens e a prevenção de violência no Brasil.

– A existência de Territórios da Paz e de Unidades de Polícia Pacificadora será muito importante para a recuperação desses adolescentes. Existe mais esperança para eles em territórios pacificados – avalia a gaúcha Maria do Rosário, ministra da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.


A redenção de Natanael

Quem lê a ficha policial de Luiz Natanael Silva Machado quando era adolescente, arrisca uma sentença: está preso ou morto. Começou a furtar aos 10 anos. Aos 11, usou maconha e passou a dormir fora de casa. Largou a escola.

Dos 12 aos 13 anos, conheceu drogas pesadas e cometeu crimes graves: assaltava e agredia. Incontrolável, praticava delitos quase que diariamente em Montenegro, onde vivia com a mãe e o padrasto.

Era temido no comércio e em bairros residenciais. Frequentador assíduo do Conselho Tutelar, da delegacia, do fórum. Aos 14, matou um comerciante em uma tentativa de roubo. Era o ápice de uma carreira criminosa que reuniu, em quatro anos, mais de duas dezenas de ocorrências e até fuga de delegacia. Natanael foi mandado duas vezes para a Febem.

Ao sair, trapaceou o destino e, desta vez, jogando limpo. Contrariou a lógica, surpreendeu e ajudou a inserir esperança nesta série de matérias sobre a trajetória de 162 ex-internos da fundação. Está casado, tem um filho, trabalha e usa o currículo de crimes para falar a jovens sobre amor, drogas e futuro como evangelizador da Igreja Pentecostal Unida do Brasil.

– Ex-drogado, ex-ladrão, ex-interno da Febem, estou aqui para contar o que Deus fez na minha vida – anuncia a fiéis.

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