domingo, 17 de junho de 2012

FILHO DA RUA - FAÇA A SUA PARTE

 (Editoria de arte)

FILHO DA RUA


CAPA DE REPORTAGEM ESPECIAL

REPORTAGEM: LETÍCIA DUARTE IMAGENS: JEFFERSON BOTEGA


Felipe é infantil, mas agressivo; pede ajuda, mas não larga o crack; procura a família, mas vive nas esquinas. A sociedade sustenta seu vício com esmolas. A mãe cansou da luta para resgatá-lo. Projetos sociais dos governos fracassaram na missão de ajudá-lo. Por três anos, ZH seguiu os passos de Felipe e mostra, nesta reportagem, como a mistura de omissão, pobreza, desestrutura familiar e falta de horizontes é o berçário ideal para o nascimento de um menino de rua.

O não leitor



Marta Gleich. Diretora de Redação


O exemplar de Zero Hora que você tem em mãos será lido neste fim de semana por mais de 1,4 milhão de pessoas. Algo como lotar o Beira-Rio e o Olímpico por 13 jogos.

Há um problema, porém: o personagem principal desta edição, Felipe, não vai ler a sua própria história, porque é analfabeto. Nada mais simbólico.

Por mais de três anos, com autorização do Juizado da Infância e da Juventude, a repórter Letícia Duarte seguiu os passos de Felipe (o nome está trocado em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente), numa das reportagens de maior fôlego já realizadas por Zero Hora, para mostrar como nasce um menino de rua.

Foi uma difícil caminhada. Dúzias de vezes, Letícia e o fotógrafo Jefferson Botega saíram às ruas, ora com a mãe de Felipe, ora com um conselheiro tutelar, ora sozinhos, tentando encontrar o menino. “A busca da mãe era também a minha busca”, lembra Letícia. “Nunca sabia se iria encontrá-lo.” O projeto da reportagem, aprovado em 2008 pelo então diretor de Redação, Ricardo Stefanelli, teve viradas dramáticas, quase naufragou e, por fim, encontrou o seu próprio rumo.

Em maio de 2009, quando a reportagem estava pronta para ser publicada, uma guinada dolorosa na vida de Felipe: ele foi queimado na rua e, depois de ficar hospitalizado, voltou – infelizmente por pouco tempo – para junto da mãe. Não era mais um menino das esquinas, portanto. Qual seria o desfecho? Ele conseguiria se integrar a uma escola? Deixaria definitivamente a rua dali por diante?

“O que a gente previa lamentavelmente aconteceu: ele voltou para a rua. Em vários momentos achávamos ‘agora, vai’, ele vai tomar prumo. O Felipe tinha cinco anos quando começou a sair de casa. Ninguém – nem a mãe, nem a rede de proteção oficial – conseguiu segurar uma criança. Foi uma tragédia anunciada. É como se estivesse todo mundo vendo o menino na beira do abismo, todo mundo alertando ‘ele vai cair’, ‘ele vai cair’. E ninguém conseguiu segurar. Agora, Felipe já está no caminho do crime”, relata a repórter.
Letícia Duarte, 31 anos, é uma jornalista diferenciada. Em 2002, ganhou o Prêmio Esso, o mais importante do país, como repórter do jornal Pioneiro, do Grupo RBS, com a série “Adolescência Prostituída”. Detalhe: ela ainda não havia se formado em Jornalismo na Universidade de Caxias do Sul, o que ocorreria um mês depois. Desde então, vem colecionando distinções, em reportagens como “Herdeiros da aids” e “Mulheres marcadas pelo câncer”. “Histórias sociais, histórias de dor”, como ela mesma define.

As últimas semanas foram duras para Letícia. Ainda sem filhos, andava pela Redação ansiosa, dizendo sentir “as dores do parto”. Ao dar à luz o caderno Filho da Rua, que gestou durante tanto tempo, tirou uma cópia na impressora e apressou-se em fazer uma visita necessária. Pegou um carro do jornal e dirigiu-se à Vila do Esqueleto, onde mora a mãe de Felipe. Queria que ela tivesse a dimensão da reportagem e do impacto que a publicação poderá ter na vida deles.

Comovida, a mãe de Felipe leu as páginas dizendo “mas é a minha vida, como num livro!”.

As 16 páginas desta reportagem não tratam somente da vida de Felipe e de sua mãe. Tratam, de forma simbólica, da existência dramática de tantos brasileiros excluídos. E não deixam de ser parte da vida de todos nós, corresponsáveis pelas aventuras e desventuras deste menino.

Zero Hora publica esta história por vários motivos. Porque a função de um jornal é contar histórias. Porque a função de um jornal também é causar desconforto e emoção, para que as coisas mudem. E porque, às vezes, a função de um jornal é contar uma história para que ela não se repita.
 

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Como cada um pode contribuir para evitar a migração de crianças e adolescentes para as ruas

ZEROHORA.COM

No site, assista ao webdocumentário que retrata a luta de quem trabalha para resgatar os meninos de rua da Capital.
CIDADÃOS
- Não dê esmola – A esmola (e isso inclui comida) só contribui para fixar as crianças na rua. Frequentemente, serve para sustentar o consumo de drogas.
- Dê atenção – Em vez de dar bens materiais, você ajudará mais se conversar com as crianças. Em pesquisas, boa parte dos meninos de rua relata: o maior sonho é não causar medo nas pessoas.
- Chame ajuda – Em Porto Alegre, contate o Ação Rua quando vir uma criança em situação de rua: (51) 3289-4994. Os educadores conversam com as crianças e procuram encaminhá-las a programas, mas não as retiram à força da rua.
- Contribua com quem ajuda – Uma boa alternativa é fazer doações aos fundos municipais ou estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente. A contribuição garante que uma parcela do seu imposto de renda seja aplicada em programas sociais. Se os gaúchos doassem 6% do imposto devido aos fundos municipais e estadual, o Estado arrecadaria em torno de R$ 60 milhões para financiar projetos de assistência.
ONDE CONTRIBUIR:
Fundo Estadual da Criança e do Adolescente
- Doações para abatimento do imposto de renda podem ser feitas pelo site www.podcrianca.rs.gov.br ou por depósitos bancários:
- Conta: 03.231350.0-1
- Agência: 0597, do Banrisul
- Quem optar pelo depósito bancário precisa comunicar ao Conselho Estadual a doação feita, informando o nome, CPF ou CNPJ, e o valor doado para garantir a entrega do recibo. A comunicação pode ser feita pelo telefone (51) 3288-6625 ou pelo e-mail cedica@sjdh.rs.gov.br.
FUNDOS MUNICIPAIS
- Busque informações no Conselho Municipal dos Direitos da Criança de seu município
- Na Capital, você pode fazer sua doação a partir do site www.portoalegre.rs.gov.br (clique em “Secretarias”, depois em “Governança”. No canto esquerdo, clique em “Funcriança”)
ORGANIZAÇÕES NÃO-GOVERNAMENTAIS
- Invista em projetos que promovam lazer e cultura nas vilas – A falta de locais adequados para brincar e ocupar o tempo perto de casa é um dos primeiros motivos que impulsionam as crianças para longe.
- Crie pontes para o mercado de trabalho – Projetos de capacitação profissional e de geração de renda para adolescentes e suas famílias são fundamentais para garantir que as famílias transformem sua realidade. Crianças em situação de rua dificilmente concluem o Ensino Médio, mas como costumam desenvolver habilidades de comunicação podem se tornar bons atendentes de telemarketing, por exemplo.
- Amparo às famílias – Desenvolver projetos comunitários que acolham as mães, ensinando-as a dar limites aos filhos e a demonstrar afeto, por exemplo, faz diferença na vida dessas crianças, reforçando os vínculos familiares.
Fonte: Fontes: Ivaldo Gehlen, professor de sociologia da UFRGS e coordenador do Censo de Crianças e Adolescentes em Situação de Rua de Porto Alegre, 2007/2008, Kevin Krieger, ex-presidente da Fasc, Lucas Neiva-Silva, professor de psicologia da Universidade Federal do Rio Grande e pesquisador do Centro de Estudos Psicológicos sobre Meninos e Meninas de Rua da UFRGS, Márcia Herbertz, presidente do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedica), Maria Antonieta da Costa Vieira, socióloga integrante do Fórum Nacional de Estudos sobre a População de Rua.

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