segunda-feira, 11 de junho de 2012

FASE QUER PROFISSIONALIZAÇÃO TOTAL EM 2012

Joelza Mesquita, presidente da fundação, espera que novas casas comecem a tomar forma no ano que vem

Joelza Mesquita, presidente da fundação, espera que novas casas comecem a tomar forma no ano que vem
 
 
 
 
 
 
 
 
Juliano Tatsch - JORNAL DO COMÉRCIO 11/06/2012
 
A semana que passou foi de notícias boas para a Fundação de Atendimento Socioeducativo (Fase). O governo do Estado confirmou que o órgão receberá R$ 28 milhões para a construção de quatro novas casas de internação. Os recursos são advindos de um financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Os valores devem entrar nos cofres do governo em março do ano que vem. Enquanto isso, a Fase tem metas traçadas para 2012 e os próximos anos. Em entrevista ao Jornal do Comércio, a presidente da fundação, Joelza Mesquita, aponta o foco do trabalho da atual gestão, admite superlotação e falta de pessoal e defende a ressocialização dos adolescentes.

Jornal do Comércio - A Fase viveu um momento de turbulência no governo passado, quando, por pouco, o terreno do Morro Santa Teresa não foi vendido sob a alegação de se obter recursos para a reestruturação da fundação. Hoje, qual é a situação da Fase?

Joelza Mesquita - Não se tem nenhuma expectativa em vender esse terreno. Há um decreto do governador dizendo que, pelo menos na gestão dele, isso não será feito. Temos 950 adolescentes cumprindo medida socioeducativa no Estado. Destes, em torno de 855 estão internados, e o restante está em semiliberdade. Temos metas importantes. A primeira diz respeito à escolarização. Nossos adolescentes têm uma escolaridade muito baixa. Mais da metade deles só tem até a quinta série do Ensino Fundamental, por isso tínhamos dificuldade em colocar a profissionalização aqui dentro. Começamos a adequar a profissionalização à escolarização.

JC - Como essa questão da escolarização pode ser resolvida?

Joelza  - Vimos que a escolarização precisava ser aumentada. Em todas as unidades, há uma escola. Os meninos que estão aqui têm de estudar. Só que eles não saíam do lugar. Então, estreitamos a relação com a Secretaria de Educação, montamos um grupo de trabalho. A proposta foi trazer outro programa para atender à nossa demanda. O que tem lá fora e que poderia nos ajudar aqui? O EJA (Educação de Jovens e Adultos). Estamos trabalhando pra trazer o EJA para cá. Os meninos daqui estão fora da escola há muito tempo. A escola não conseguiu acolher quando eles estavam lá fora. E aqui, com a proposta lá de fora, não conseguirá acolher também. É preciso uma proposta diferenciada. Provavelmente, até o final do ano, o EJA estará entrando aqui.

JC - E a respeito da profissionalização?

Joelza - Só quem já tinha a possibilidade de realizar atividade externa poderia alcançar a profissionalização. Tínhamos dificuldade com a profissionalização porque eles tinham baixa escolaridade. Os meninos que já podem sair para realizar atividade externa, que são um terço da nossa população, faziam cursos. Geralmente, fazem atividade externa durante o dia e, à noite, cursam a escola na unidade. Os que estavam fechados não tinham essa possibilidade. Trouxemos uma série de cursos profissionalizantes para cá. Estamos firmando parceria com o Pronatec, com o Sistema S. Estamos em parceria com a Superintendência Regional do Trabalho, com o Banrisul. Também estamos firmando um acordo com o Projeto Pescar. Levaremos a certificação para dentro das unidades, pois isso tem mais impacto no mercado de trabalho.

JC - Qual a situação da estrutura física da fundação?

Joelza  - Temos de tratar da superlotação. Estamos com 854 meninos e com o déficit de 118 vagas. Isso são quase três casas. Cada casa tem 40 vagas. O POA I foi construído para 62 adolescentes. Estamos com 130. O POA II foi construído para 70 adolescentes, e temos 121. A casa provisória Carlos Santos tem capacidade de 60 adolescentes. Estamos com 116. Não podemos pegar o menino de uma casa e colocar em outra, porque são perfis diferentes. Temos 63 meninos na unidade Padre Cacique. Eles são de Osório e de Santa Cruz. Temos essas duas casas para construir. Os recursos existem, mas não temos o acordo com as prefeituras. Construindo essas duas casas, fechamos a regionalização, descentralizando o atendimento. Temos a ideia de construir uma casa metropolitana. Aqui temos meninos de Viamão, Canoas, Cachoeirinha, Alvorada. A intenção é colocá-los nessa casa.

JC - Faltam recursos humanos na Fase?

Joelza  - Quando assumi, tínhamos um déficit de 700 funcionários. Começamos 2012 já com a contratação emergencial de 87 servidores. Conseguimos colocar uma equipe mínima nas casas. Esse ano poderemos fazer o concurso público, inicialmente para 85 funcionários. Precisamos de médicos, por exemplo. No ano passado, se aposentaram a ginecologista e um médico clínico. Ficou uma neurologista e um clínico. São dois médicos hoje. Não adianta levar o jovem para ser atendido na rede. A rede nos ajuda e dá suporte, mas precisamos de atendimento no dia a dia.

JC - Qual é o orçamento do órgão?

Joelza - Chega a R$ 130 milhões ao ano. Esse valor é para tudo.

JC - Qual o percentual atual de reincidência dos jovens que entram na fundação?

Joelza - Temos um índice de 39% de reincidência. Mas não tenho absoluta certeza desse percentual. Só poderei dizer se realmente diminuiu o número de reincidentes no fim da minha gestão, depois de todas as ações que estamos implantando. Talvez no final do ano já tenhamos um dado.

JC - Houve um tempo que havia muitos motins. Esse quadro mudou. Quais as razões?

Joelza - Acho que isso se deve à gestão mais aberta. Estamos, inclusive, implantando um programa de cultura da paz, do qual todas as casas irão participar. Procuramos atuar muito próximos das casas. Temos feito uma articulação com o Ministério Público, com o Judiciário, com o sindicato dos funcionários. A mudança no quadro de motins talvez tenha ocorrido por estarmos dialogando mais.

JC - Qual o perfil do interno da Fase?

Joelza - Basicamente, meninos de 15 a 17 anos, com escolaridade até a quinta-série, cerca de 20% sem o pai no registro de nascimento e 70% sem a figura do pai presente. A maior parte é de brancos, que entram por causa de roubo ou tráfico de drogas. A grande maioria, claro, é pobre. Até porque rico nunca chega aqui. Não chega nem na delegacia.

JC - Como visualiza o futuro da Fase nos próximos anos?

Joelza - Ano passado foi o diagnóstico. Vamos institucionalizar a profissionalização em educação neste ano. No ano que vem, as novas casas terão de sair do papel. Em 2014 vamos tirar frutos. Acredito muito na ressocialização. Quero que a Fase não seja um espaço de contenção ou internação, mas de educação. Os meninos daqui se atrapalharam e estão, nesse tempo, pensando sobre os seus atos e se preparando para conviver em sociedade. Em torno de 5% do nosso adolescente é difícil de recuperar. Muito difícil, eu acho. Mas 95% deles eu tenho certeza de que podem ser recuperados. Isso não depende só da Fase, mas também da sociedade, em poder acolhê-los.

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