quinta-feira, 15 de maio de 2014

O DESCASO DIANTE DE UMA POSSÍVEL CONDENAÇÃO

Promotores do MP concedem entrevista em Três
Passos (Foto: Estêvão Pires/G1)


Do G1 RS 15/05/2014 18h22

'Não tenho dúvida', diz familiar sobre pai de Bernardo ser mentor; ouça. MP liberou parte das escutas telefônicas durante coletiva; ouça os áudios. Órgão denunciou pai, madrasta, amiga e seu irmão como culpados.

Estêvão Pires


O Ministério Público do Rio Grande do Sul liberou parte das escutas telefônicas interceptadas pela Polícia Civil durante as investigações da morte do menino Bernardo Boldrini, de 11 anos, em Três Passos, na Região Noroeste. Uma das interceptações mostram uma conversa do padrasto de Graciele Ugulini, madrasta do menino, Sérgio, confirmando o envolvimento do genro no crime. Os áudios foram uma das provas apresentadas durante o inquérito policial (escute ao lado).

Em coletiva de imprensa, na tarde desta quinta-feira (15), o MP denunciou o pai Leandro Boldrini, a madrasta Graciele Ugulini, a assistente social Edelvânia Wirganovicz e o seu irmão, Evandro Wirganovicz. Veja a íntegra da denúncia aqui.

"O mentor ideológico é ele [Leandro Boldrini]. Eu não tenho dúvida disso. Essa certeza que a delegada tem eu também tenho", fala Sérgio, pai da madrasta de Bernardo. Nas conversas, ele fala ainda sobre o depoimento da filha inocentando o médico. "Ele vai acabar saindo, né. Ela inocentou ele, mas acho que isso aí é jogo dos advogados", afirma. No áudio, Sergio conversa com uma mulher que ele chama de Magali, mas que ainda não foi identificada pelo MP.

Para a promotora, a frase de Sérgio é uma prova importante da investigação. “Essa foi a frase mais clara de todo o diálogo”, afirmou a promotora.

Bernardo Boldrini foi encontrado morto no dia 14 de abril, enterrado em um matagal em Frederico Westphalen, no norte gaúcho, a cerca de 80 km de Três Passos, onde morava com o pai, a madrasta Graciele Ugulini e a meia-irmã. Ele estava desaparecido desde 4 de abril. Leandro, Graciele, a assistente social Edelvania Wirganovicz e seu irmão Evandro Wirganovicz estão presos. Os três primeiros foram indiciados por homicídio qualificado, e a participação do quarto ainda é investigada.

Veja o diálogo entre Sérgio e mulher que ele chama de Magali:

Sérgio: Nada me faz pensar diferente. Até pelas cinco, seis vezes que eu convivi ajudando na procura do Bernardo, que eu convivi com o Leandro...
Magali: Leva a crer e ter certeza de que...
Sérgio: Que o mentor ideológico é ele. Eu não tenho dúvida disso.
Magali: Com certeza.
Sérgio: E ele vai acabar saindo. Ela inocentou ele, né, no depoimento.
Magali: Isso que eu não entendi porquê.
Sérgio: Acho que é jogo dos advogados.
Magali: Mas tu viu que a delegada tem certeza do envolvimento dele. Alguma coisa ela tem que que ter.
Sérgio: Mas a certeza que ela tem, eu também tenho.


Familiares falam sobre Graciele inocentar o marido

Em outro áudio apresentado, Sérgio discute com o filho Leonardo sobre a carta que Graciele enviou, inocentando o marido. Segundo o padrasto, os advogados de defesa realizaram uma reunião para discutir estratégias. Ele volta a reafirmar o envolvimento de Leandro no homicídio (escute ao lado).

Veja o diálogo entre Sérgio e o filho:

Leonardo: Ô pai, mas o Leandro tem a ver, né?
Sérgio: Claro, mas ela mandou uma carta ontem pra Simone inocentando ele. Mas, os advogados se reuniram na semana passada para ver uma estratégia para ele sair de tudo, né, e ela fica pagando lá e depois dá um jeito.
Leonardo: Vai ficar 10 anos, né?
Sérgio: Não fica 10. Fica cinco, seis anos. Porque vai cada dia trabalhado, três dias trabalhado desconta um.
Leonardo: É, então se fica 10 anos, vai descontando, fica sete.
Sérgio: Aí, fica sete, né.
Leonardo: Depois mais o bom comportamento, e tal, vai pro semi-aberto.


Irmã de Graciele diz que Leandro fez "lavagem cerebral" na mulher

Em uma outra gravação interceptada pela polícia, a irmã de Graciele, Simone Ugulini, conversa com uma pessoa não identificada. As duas mulheres falam que Leandro pode ter feito uma “lavagem cerebral” com a Keli, apelido da madrasta de Bernardo. Citam ainda que ele deve ter enlouquecido ela como fez com Odilaine, a ex-esposa, mãe do garoto, que se suicidou em 2010 (ouça ao lado).

Veja o diálogo entre Simone e uma amiga não identificada:

Mulher não identificada: Ele “pilhou” a Keli...
Simone: Não, a Keli não é assim. A gente conhece a minha irmã.
Mulher não identificada: Ele enlouqueceu ela, Simone, como deve ter enlouquecido a Odilaine. Não sei… uma lavagem cerebral. Ele deve ter enlouquecido ela como enlouqueceu a outra.
Simone: É...
Mulher não identificada: Sei lá o que ele faz… Não sei, não sei…
Simone: Lavagem cerebral.

Além dos áudios apresentados, Dinamárcia falou também da troca de SMS e contatos telefônicos entre Edelvania e Graciele. Nos telefonemas, elas inventam um álibi em Frederico Westphalen para justificar a ida da madrasta de Bernardo para lá. "É uma riqueza de detalhes que mostra com clareza o envolvimento das duas", afirma a promotora.


Ministério Público denuncia pai por falsidade ideológica

Leandro, Graciele e Edelvânia responderão por homicídio quadruplamente qualificado (motivos torpe e fútil, emprego de veneno e recurso que dificultou a defesa da vítima) e ocultação de cadáver. Evandro também foi acusado de envolvimento no assassinato e ocultação de cadáver. O pai foi denunciado, ainda, por falsidade ideológica.

A promotora Dinamárcia Maciel e o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Marcelo Dornelles participaram da entrevista coletiva. O anúncio ainda foi acompanhado pela delegada Caroline Bamberg Machado, titular da Delegacia de Polícia de Três Passos e responsável pelo inquérito que apurou o caso, além da delegada Cristiane de Moura e Silva Bauss, titular da Delegacia Regional de Três Passos, que também auxiliou nas investigações.

Durante a coletiva foi anunciada a transferência de Dinamárcia para São Luiz Gonzaga. Ela vai deixar a Promotoria de Três Passos. Com isso, o nome da nova promotora do caso será divulgado ainda nesta quinta-feira (15).

Denunciados pelo Ministério Público:

Leandro Boldrini: atuou no crime de homicídio e ocultação de cadáver como mentor, juntamente com Graciele. Ele também auxiliou na compra do remédio Midazolan em comprimidos, fornecendo a receita azul. Leandro e Graciele arquitetaram o plano, assim como a história para que tal crime ficasse impune. Ele responderá também por falsidade ideológica por ter registrado um boletim de ocorrência com informação falsa, já que, segundo o MP, ele sabia da localização do filho.

Graciele Ugulini: mentora e executadora do delito de homicídio, bem como da ocultação do cadáver.

Edelvânia Wirganovicz: executora do delito de homicídio e da ocultação do cadáver.

Evandro Wirganovicz: envolvimento no homicídio e ocultação de cadáver.

Qualificadores:

Motivo torpe: uma vez que Leandro e Graciele não queriam partilhar com Bernardo os bens deixados pela mãe da criança. Em relação à Edelvânia, a torpeza fica evidenciada, conforme a denúncia, pelo fato de ela ter aceitado participar do homicídio mediante paga ou recompensa. Ela recebeu de Graciele a quantia de R$ 6 mil, além da promessa de auxílio financeiro para aquisição de um imóvel.

Motivo fútil: já que Bernardo era filho do casamento anterior de Leandro, ele representava “um estorvo” para a nova unidade familiar estabelecida entre o pai e a sua madrasta, conforme a denúncia.

Emprego de veneno: segundo o MP, os acusados ministraram superdosagem do Midazolam a Bernardo.

Dissimulação e recurso que dificultou a defesa da vítima: Bernardo, sem condições de saber das intenções homicidas, foi conduzido até Frederico Westphalen e recebeu superdosagem, via oral e intravenosa, do medicamento.

Menino de 11 anos foi encontrado morto, enterrado
em um matagal (Foto: Reprodução/RBS TV)

Entenda

Conforme alegou a família, Bernardo teria sido visto pela última vez às 18h do dia 4 de abril, quando ia dormir na casa de um amigo, que ficava a duas quadras de distância da residência da família. No domingo (6), o pai do menino disse que foi até a casa do amigo, mas foi comunicado que o filho não estava lá e nem havia chegado nos dias anteriores.

No início da tarde do dia 4, a madrasta foi multada por excesso de velocidade. A infração foi registrada na ERS-472, em um trecho entre os municípios de Tenente Portela e Palmitinho. Graciele trafegava a 117 km/h e seguia em direção a Frederico Westphalen. O Comando Rodoviário da Brigada Militar (CRBM) disse que ela estava acompanhada do menino.

"O menino estava no banco de trás do carro e não parecia ameaçado ou assustado. Já a mulher estava calma, muito calma, mesmo depois de ser multada", relatou o sargento Carlos Vanderlei da Veiga, do CRBM. A madrasta informou que ia a Frederico Westphalen comprar um televisor.

O pai registrou o desaparecimento do menino no dia 6, e a polícia começou a investigar o caso. Na segunda-feira (14), o corpo do garoto foi localizado. De acordo com a delegada responsável pela investigação, o menino foi morto por uma injeção letal, o que ainda precisa ser confirmado por perícia. A delegada diz que a polícia tem certeza do envolvimento do pai, da madrasta e da amiga da mulher no sumiço do menino, mas resta esclarecer como se deu a participação de cada um.

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