quinta-feira, 8 de maio de 2014

ABUSO NA INFÂNCIA


ZERO HORA 07/05/2014 | 19h54


Um em cada cinco brasileiros sofreu abuso na infância. Segundo pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), abuso de álcool e drogas é principal causa do problema


por Jaqueline Sordi


Crianças humilhadas, ameaçadas com facas, machucadas e vítimas dos mais diversos tipos de violência dentro de casa — por pais ou cuidadores — são mais frequentes do que se imaginava no Brasil. Os dados do 2° Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (Lenad), realizado por pesquisadores da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e divulgados nesta quarta-feira, alarmaram os pesquisadores e mostraram, pela primeira vez, que o Brasil é uma nação de pais violentos.

Conforme o estudo, 21,7% da população — um a cada cinco brasileiros, o que representa mais de 30 milhões de pessoas — sofreu algum tipo de abuso quando criança.

O consumo excessivo de álcool e outras drogas é apontado como causa e consequência dessas agressões. Os entrevistados relataram que, em 20% das situações de violência física, o parente ou cuidador havia bebido, deixando marcas que perduraram pela vida adulta — o risco de essas vítimas se tornarem dependentes drogas é duas vezes maior do que a população em geral. Entre os usuários de álcool, o percentual que sofreu violência infantil sobre para 45,7% , chega a 47,5% entre os viciados em maconha e a 52% em cocaína. E, quando o tipo de abuso é sexual, os números são ainda mais assustadores, relata Clarice Madruga, pesquisadora da Unifesp e coordenadora do estudo:

— Dependendo do tipo de abuso, como a violência sexual, as chances de a criança se tornar um dependente de drogas podem ser até quatro vezes maiores. Temos dados que mostram que, entre usuários de crack em tratamento, a porcentagem que sofreu traumas gerados pelos pais chegou a 70%.

O levantamento ouviu 4607 maiores de 14 anos em 149 municípios brasileiros e indicou que o Brasil possui um dos mais altos percentuais de agressões de pais ou cuidadores contra crianças e adolescentes quando comparado a outras nações. Apenas uma pesquisa realizada em comunidades hispânicas nos Estados Unidos chegou a indicativos semelhantes, afirmou Clarice:

— Esta é a primeira vez que temos dados representativos nacionalmente sobre o assunto, e os números são preocupantes. Percebemos que é um comportamento cultural, independente da classe social ou nível de educação dos entrevistados.

Meninas são principais vítimas

Segundo a pesquisa, as meninas são as principais vítimas. Ao menos 20% das entrevistadas relataram que sofrem ou já sofreram algum tipo de agressão. Entre os tipos de abusos mais comuns, estão os empurrões, beliscões e arranhões. Em 11,9% dos casos, entretanto, os menores relataram que já apanharam até ficar com marcas pelo corpo. E, para agravar o problema, apenas 20% dos casos são reportados à polícia, afirma a pesquisadora:

— Muitas crianças aparecem em hospitais machucadas, com roxos ou membros quebrados, e os médicos não questionam a origem da violência. O que chega à polícia são casos mais graves, que envolvem morte. Essa falta de suporte faz com que as crianças sofram caladas por mais tempo, o que as leva a desenvolver quadros de depressão, adição à drogas e até mesmo suicídio.

Para Joana Narvaez, psicóloga da Unidade de Adição Alvaro Alvim, do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, os dados da pesquisa confirmam não só sua percepção clínica — grande parte dos pacientes internados relatam terem sido vítimas de violência na infância ou adolescencia — como mostram que a adição às drogas, preponderamente ao crack, representa um sintoma antes de tudo social. Conforme Joana, um estado que não protege essas vítimas, que não contém a violência infantil e não dá suporte às famílias colabora para o alto índice de dependentes químicos:

— Jovens que sofrem traumas, que não tem ainda recursos psíquicos para dar conta da situação e que vivem em um ambiente sem adequada proteção ficam mais sucetíveis a buscar nas drogas uma fonte de anestesia, de alivio — comenta.

Os pesquisadores que realizaram o levantamento apontam que o quadro constatado mostra a necessidade de investimentos para que escolas e unidades de saúde tenham condições de detectar crianças que estejam sendo vítimas de violência por parte de familiares.

— O primeiro passo é a prevenção primaria, que significa educação. É preciso esclarecer aos pais que reforçar as atitudes positivas das crianças é muito mais eficaz do que punir as atitudes negativas. Nos casos em que a violência ocorre, é necessária uma rede de proteção e acompanhamento para estas famílias. A prevenção pode, em apenas uma geração, diminuir nossos problemas com abuso de substâncias psicotrópicas como o álcool, a cocaína e o crack — resume a pesquisadora.

Violência sexual

Pouco mais de 5% dos brasileiros acima de 18 anos, ou 5,4 milhões de pessoas, foram vítimas de abuso sexual da infância, cometida principalmente por algum parente (pai, padrasto e irmãos não se encaixam nessa categoria), um amigo próximo à família da criança ou um desconhecido.

Conforme a pesquisadora, o que diferencia a violência sexual das demais é o fato de causar um trauma menos reversível. Com outros tipos de abusos, uma rede de suporte estruturada e um sistema de precaução podem minimizar os danos . Mas, no Brasil, essa ainda é uma realidade longe de ser alcançada.


COMENTÁRIO DO BENGOCHEA- Apesar deste assunto ser muito válido como alerta às famílias no trato das crianças e adolescentes no Brasil é precisa separar o que é abuso e violência, da disciplina que deve ser imposta pela autoridade dos pais para que não cresçam na permissividade. E vale a pena ressaltar o comentário oportuno de um leitor online:

Bras • "A primeira coisa a discutir é o propósito dessas supostas pesquisas. Depois, a quem interessa a divulgação desses alegados resultados, tal como redigidos. O papel e as planilhas aceitam tudo. Cientificidade, coerência de procedimentos, toda vez que minimamente investigadas, nesses simulacros de estudos, resultam sempre tão escassas e longínquas quanto naqueles do IPEA sobre violência da mulher. A ideia de "verdade legitimada por estudos supostamente acadêmicos" não deveria passar pela cabeça de ninguém. Quem paga por esses "estudos"? Quem financia esses "resultados"? Que interesses nessa guerra de informações movem tais grupos? A sociedade deveria sempre lembrar a escala crescente de mentiras estabelecida por Mark Twain: há mentiras, mentiras deslavadas e... estatísticas. Usemos de bom senso, de espírito de exame, de cautela."

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