26 de setembro de 2012 | N° 17204
BARBÁRIE NA SERRA. Dívida de R$ 2 levou à morte de papeleiro. Adolescentes admitiram ter ateado fogo a morador de rua na sexta-feira
RÓGER RUFFATO | Caxias do Sul
Problemas
comportamentais de quatro adolescentes, com origem na desestruturação
familiar, são o pano de fundo da morte de Carlos Miguel dos Santos, 45
anos. Dois irmãos, de 13 anos e 15 anos, acompanhados de dois amigos,
ambos de 14 anos, confessaram à Polícia Civil de Caxias do Sul terem
ateado fogo ao papeleiro na sexta-feira, motivados por uma dívida de R$
2.
Os jovens têm o cotidiano desregrado e costumam perambular
pelas ruas. Os pais não identificaram nos filhos mudanças de atitudes
causadas por uma série de dramas familiares. Separações dos pais e
convívio próximo da violência teriam colaborado para os garotos formarem
um comportamento de desleixo com os estudos, conforme a diretora e
orientadora pedagógica da escola onde estudam os dois irmãos.
Ela
afirma que o pai dos adolescentes, um funileiro de 36 anos, teria
retirado o mais velho do colégio com o objetivo de matriculá-lo em um
supletivo, à noite, para que o garoto pudesse trabalhar durante o dia.
–
Eu canso de falar para eles estudarem, mas não adianta. Já tive de
chamar a atenção por andarem aprontando na rua, jogando pedras em
pessoas – desabafa o pai dos menores.
Os quatro foram
identificados na noite de segunda-feira, após policiais civis
conversarem com moradores da região dos bairros Pio X e Marechal
Floriano. Conforme o delegado Joigler Paduano, os agentes receberam
informações de que a gasolina tinha sido comprada pelos adolescentes em
um posto de combustíveis próximo ao campo de treinamentos do Caxias, por
volta das 21h de sexta. O grupo teria comprado o combustível decidido a
incendiar o barraco de Santos, como vingança por uma dívida de R$ 2.
–
Eles furtaram uma faca pequena do papeleiro, que prometeu pagar R$ 2,
caso devolvessem, mas não cumpriu o combinado – relata Paduano.
Os
adolescentes foram ouvidos pela polícia entre a noite de segunda-feira e
a manhã de ontem. De acordo com o delegado, os quatro estavam
reticentes, mas acabaram contando com detalhes como tudo aconteceu.
– Jogamos gasolina em todo o corpo, até na cara – disse o adolescente de 15 anos, ao sair da delegacia.
Após
serem ouvidos, os quatro foram liberados e devem aguardar em liberdade o
término das investigações, que hoje serão assumidas pela Delegacia de
Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). A pena máxima neste caso é
de três anos de internação no Centro de Atendimento Socioeducativo
(Case). Em respeito ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), os
nomes dos adolescentes e do pai de dois deles estão sendo preservados.
Espera por perícia no local durou quase 90 horas
O
atentado contra o papeleiro ocorreu às 21h40min de sexta-feira. Mas foi
preciso quase 90 horas de espera para peritos do Instituto-geral de
Perícias (IGP) examinarem o que restou da barraca. Às 14h30min de ontem,
os servidores colheram informações que poderão ajudar na investigação.
Na
tarde de ontem, ainda havia restos de papel queimado e plástico no
chão. O carrinho usado por Santos para trabalhar não estava mais lá. Na
segunda-feira, quando a autoria e a origem das chamas não eram
conhecidas, o delegado Joigler Paduano lamentou o fato de o terreno não
ter sido isolado ainda na noite de sexta-feira. De acordo com o diretor
do Departamento de Perícias do Interior, Rogério Gomes Saldanha, o
número reduzido de funcionários no Interior, especializados em apurar
incêndios, impossibilitou que a perícia fosse feita pela equipe local do
IGP.